Fluidos corporais

Author: Constelação /


Alquimia do Corpo

Vamos tentar passar de forma clara a parte teorica, lembrando que não estamos iniciando ninguem na prática, haja vista que seu caráter empírico, em vez de pura especulação, pode ser experimentado por qualquer iniciado de qualquer escola. Em adição, muitos magistas não verão nada inédito aqui, apesar de eu não me lembrar de ter visto este assunto escrito desta maneira. Vamos dar uma pincelada rápida, passando por vários topicos relacionados a fluidos corporais como “carregadores” (do conceito caoísta já consolidado em inglês como ‘charging’) de sigilos pictográficos. Autores recomendados para leitura suplementar são Peter Carroll, Ralph Tegtmeier (Frater U.:D.:), Michael Staley, Dave Lee e Jaq D. Hawkins, bem como o artigo Indocrination, postado pelo caoísta Max em alt.magick.chaos e no Spiral Nature. Além disso, uma introdução à Cibermagia (Cybermagick), campo ainda em desenvolvimento, poderia tirar algumas dúvidas e corroborar o que é proposto aqui.

Em primeiro lugar, vamos dar uma olhada na convenção acadêmica sobre o Sistema Endócrino (extraído da Wikipédia):

”...Sistema endócrino é formado pelo conjunto de glândulas que apresentam como atividade característica a produção de secreções denominadas hormônios.

Freqüentemente o sistema endócrino interage com o sistema nervoso, formando mecanismos reguladores bastante precisos. O sistema nervoso pode fornecer ao sistema endócrino informações sobre o meio externo, enquanto que o sistema endócrino regula a resposta interna do organismo a esta informação.

Dessa forma, o sistema endócrino em conjunto com o sistema nervoso atuam na coordenação e regulação das funções corporais.

Alguns dos principais órgãos que constituem o sistema endócrino são: a hipófise, o hipotálamo, a tiróide, as supra-renais, o pâncreas e as gônadas (os ovários e os testículos)...”

Em Líber Null, Carroll divide o estado de transe (gnosis) em dois modos: Inibitório e Excitatório. Mais tarde, Frater U.:D.: comenta estes modos e os destrincha, em seu High Magic in Theory & Practice, num esquema muito útil. Não cabendo aqui exibir as práticas que vão desde o uso do Samadhi Tank até o sexo tântrico de madrugada no cemitério, limitamo-nos a uma análise mais profunda: todas as práticas de gnosis possuem como matéria-prima fluidos biológicos, sejam eles exteriorizados pelos canais corporais ou não.

Note que exteriorizar é diferente de excretar – hormônios podem ser excretados por glândulas, injetados no corpo e permanecerem nele; enquanto a exteriorização é uma qualidade peculiar de alguns fluidos, como o sêmen, fluídos vaginais, suor, sangue e muco. Sim, a prática mágicka pode ser bem nojenta se você não se desvencilhar dos conceitos judaico-cristãos que assolam seus pais, os pais deles antes deles e os pais dos pais deles.

No trecho acima, retirado da Wikipédia, temos a afirmação científica de que o Sistema Endócrino interage com o Sistema Nervoso – não é preciso ser médico para saber disso, mas por via das dúvidas, é melhor que fique claro. O estado alterado de consciência, conhecido como gnosis ou transe, é um fenômeno obviamente neurológico. E se este tipo de reação é provocada e regulada pelo Sistema Endócrino, reservamo-nos no direito de presumir e afirmar que as substâncias glandulares são a chave alquímica para possibilitar o trabalho mágicko.

Se você já pratica

Estas observações me vieram à mente há alguns anos, quando eu era iniciante em chaos, lá por 1996/1997, em que eu tentava fazer a prêua de um sigilo ser carregado pela postura de morte. Na época eu me lembro que o bagulho tinha nível de dificuldade nightmare. Depois, é claro, a muito custo eu consegui. Mas confesso que mesmo tendo conseguido, sempre preferi a prática onanista, pois dava resultado do mesmo jeito, além de ser gostosinho.

Ninguém está querendo mijar no trabalho do Spare – se não fosse esse gênio, não haveria Zos Kia Cultus nem Sigilização. A questão é que cada indivíduo se adequa melhor a uma ou outra forma de gnosis e não adianta ficar insistindo no que não é pra você – embora estas tentativas possam trazer o estado gnóstico de exaustão e o sigilo acabar sendo carregado de qualquer maneira. Pela exaustão, não pela postura de morte. Então percebi que meu problema era com o modo inibitório da gnosis. E como qualquer outro símio, também tenho minhas obsessões com aquilo que não consigo. Comecei a pesquisar o Samadhi e o que poderia favorecer um fumante cafeinômano a atingir esse estado. No final das contas, descobri o Sistema Endócrino na magia e ele sobrepôs toda aquela obsessão.

Acredite em mim, se você souber um pouco sobre glândulas, hormônios e ritmos cardíacos, o Samadhi, a postura de morte e as técnicas

O Sangue

É quase impossível estudar xamanismo e magia simpática, cultos e rituais antigos, sem esbarrar no sangue. Vodu, Santería, Quimbanda, Magia Tibetana, Magia Shaivista, Magia Babilônica, Magia Hebraica, Magia Asteca, Magia Maia – são alguns exemplos de sistemas que se desenvolveram em torno do sangue. De fato, alguns se tornaram verdadeiros cultos ao sangue. Pudera, o sangue é a água da vida, a seiva de Yggdrasil, a força vital e o fluxo energético. É coberto de sangue que um ser humano vem ao mundo; é o sangue que sinaliza que uma fêmea está fisiologicamente apta a gerar vida e marca os machos em rituais de adolescência; e, para os guerreiros antigos, eram cobertos de sangue que muito provavelmente deixariam este mundo.

O sangue cobre relativamente bem o ciclo mitológico da roda da vida. Mas este não é o principal fator pelo qual foi introduzido na prática mágicka, onde muitas vezes foi utilizado para alimentar os deuses e pagar os espíritos. É pela relação que o sangue tem com o conceito de informação. Na magia simpática, por exemplo, é o sangue da vítima que orienta, da maneira mais eficiente, a quem deve incidir o feitiço. É também o sangue que transfere hereditariamente a nobreza ou a corrupção, a saúde ou a doença, a fertilidade ou a putrefação.

Existe ainda o sacrifício animal (que eu particularmente não concordo), onde o sangue age como um recurso energético a ser direcionado. Além disso, quando um magista usa uma gota de seu próprio sangue para carregar um sigilo, ele está praticando microcosmicamente o processo Solve et Coagula alquímico, ensinado nos antebraços de Baphomet. Ao furar o dedo, por exemplo, a dor gera o estado de gnosis (como frisa Carroll, a autotortura e flagelação são módulos de gnosis prediletos de alguns filipinos, cristãos e hindus) e o sangue, ungindo o sigilo, leva a informação adiante que culmina por coagular em pouco tempo – simulando a idéia de materialização do resultado intentado. Esta técnica pode ser aperfeiçoada de maneira a criar paradigmas com relação ao objetivo do sigilo, como por exemplo, furar o dedo anelar para sigilos de amor (Vênus), o médio para guerra (Marte) e o indicador para magia monetária (Júpiter). Sempre que eu não tenho muito tempo ou saco para atingir estados gnósticos específicos, eu uso o sangue dessa maneira. Nunca me falhou, mas assim como para mim a postura de morte era praticamente inaplicável, esta técnica também pode ser ineficaz para algumas pessoas. Entretanto, deve funcionar para a maioria dos feiticeiros. Vale salientar que ninguém está dizendo para matar bebês ou cometer outro tipo de bastardice ritual inútil que garanta que o Datena fique manchando a imagem do ocultismo (mais do que já está manchada). Não faça cagada!

Sêmen e Fluidos Vaginais

Também não é novidade a relação entre sexo e magia. Tal afinidade é tão forte e tão antiga que propiciou ambiente para a criação de todo um sistema de magia sexual. O orgasmo é tido como o vazio da mente, ‘petit mort’, semelhante ao não-pensamento taoísta e ao Samadhi, onde a vontade pode ser impregnada no subconsciente e precipitar o resultado mágicko. Juntamente com o orgasmo, os fluídos relacionados com o sexo e a fertilidade têm grande utilidade mágicka. Não somente na espermofagia crowleyana, mas também na função de sigilos com esperma, fluidos vaginais e sangue menstrual. Isto porque estes fluidos estão relacionados diretamente com a geração da vida (além da excitação sexual), a fertilidade (em outros conceitos que não somente biológicos, ex. arte, filosofia, prosperidade, etc.) e a encarnação do intento. Assim como o DNA carregado no sêmen possui informações e instruções de como será o ser fecundado pelo óvulo, o intento mágico é também transferido pelo mesmo sêmen que deverá ser fecundado pelo sigilo.

A ênfase da magia sexual em técnicas semelhantes a esta pode fazê-la parecer uma prática restrita aos homens. Contudo, a lubrificação vaginal tem tantas qualidades mágickas quanto o esperma. Fluídos vaginais são compostos de água, piridina, esqualeno, ácido acético (vinagre bioalquímico), álcool, glicol, ácido lático, cetona e aldeído – todos elementos que invertem as qualidades espermáticas: em vez de levar informação a ser fecundada, eles de fato fecundam a informação pictográfica do sigilo. Porém, as mulheres dispõem de uma propriedade mágicka não compartilhada com os machos: o mênstruo unifica os poderes do sangue com os poderes dos fluidos sexuais – além da dor das cólicas, que podem levá-las naturalmente a um estado gnóstico.

Urina e Suor

Na Alquimia medieval, a urina era utilizada na transmutação de metais e alguns alquimistas diziam que ela tinha a propriedade de “matar” metais nobres. Isso provavelmente se deve ao amoníaco e à uréia. Por tal relevância, a urina ganhou até seu próprio símbolo alquímico.

Com tais conceitos anexados à sua essência, a urina pode ser aplicada à sigilização entrópica, quando há a intenção de corroer e deteriorar um inimigo lentamente. É desta mesma prerrogativa que surge o costume de “mijar no túmulo do inimigo”. Além disso, pode ser usada em sigilos que visam a própria transformação interna, mas neste caso o suor seria mais aplicável, pois além de ter substâncias e comportamentos semelhantes ao da urina, vem vinculado aos princípios do esforço, da disciplina e da perseverança.

Saliva e Muco

A saliva e o muco são particularmente indicáveis para sigilos de banimento, proteção e exorcismo, embora a saliva também possa ser empregada como a urina em sigilos entrópicos. Isso porque uma das principais funções da saliva é iniciar a digestão e, portanto, simpaticamente a dissolução do inimigo. Entretanto, a saliva também desempenha o papel de remineralizar os dentes, excretar toxinas e proteger a mucosa bucal – o que a torna um célebre aditivo em sigilos de proteção. Em todo caso, não seria boa idéia cuspir numa pessoa possuída. O Muco tem a função de proteger as vias respiratórias contra invasões de bactérias e ataques químicos, o que faz dele um fluído tipicamente aplicável a sigilos de proteção para pessoas e lugares.

Últimas palavras

Existem ainda enzimas e hormônios que, como dissemos anteriormente, não entram em contato com o mundo externo e seu papel é desempenhado puramente nos estados de consciência, gnosis ou transe. Além disso, os chakras podem ser identificados com glândulas específicas e as substâncias produzidas por estas glândulas podem ser interpretadas como materialização da energia propagada pelos chakras.

Enfim, os principais fluidos empregados para substituir ou intensificar o efeito da gnosis são o sangue e os fluidos sexuais. A urina e os outros foram adicionados aqui para inspirar práticas experimentais e traçar paralelos entre a bioalquimia e a energização dos sigilos. Aleister Crowley desenvolveu estas biotecnologias ao extremo, fazendo uso inclusive das fezes e da abominável coprofagia. Mas como diria minha avó: “Quando o assunto chega em merda, é melhor parar por aqui”.

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